segunda-feira, 28 de fevereiro de 2011

Tão

É engraçado como a vida me acontece em etapas, intervalos, de uma forma irreverente e espontânea.

Eu, já tão velho

Eu já tão desgastado pela dureza da vida

Eu já tão reformado em retalhos

Já tão dilacerado por tantas emoções

Nenhuma tão relevante

Nenhuma tão producente

Nenhuma tão nobre


Eu já tão calejado por palavras

Já tão completo pela teoria

Já tão instruído dos males e firmes do amor

Já tão informado das faces duras da dor

Me vejo como nunca me vi

Não me reconhecendo em mim

Com uma dor sem motivo

Com uma ansiedade inebriante


Eu cai e não levantei

Me joguei e não me ergui

Me afundei onde muitos homens não puderam voltar

Me vejo agora dentro do que conhecia apenas em canto

Sou agora a personagem angustiada das minhas histórias

Aquela que se desfigura

Que se refrata

Que se dispõe a ser o que é em sua plenitude

Que se faz transparente e dinâmico

Que se entrega em pura paixão


Agora falo com mais propriedade

Pobres dos homens apaixonados

Fadados a dor confortável da saudade

De se esperar o que não chega na hora que deveria

Que não dá chance ao alivio

Quando a minha rosa se mistura com o feto

E a poesia transpira a dor que vicia

Que não deve cessar

O aperto no peito

O suor na cabeça

As mãos que também transpiram

Em pleno movimento de expectativa

Em plena fantasia de anti-reciprocidade


Eu vejo agora

Porque nas mentes inebriadas que eu descrevo

O mundo deixa de ser suficiente

A solidão deixa de ser companheira ideal

E tudo se torna pouco

O eu é muito pouco

O tu é tão distante

E o nós é o único produto sustentável da vida que agora recomeça.

segunda-feira, 21 de fevereiro de 2011

Ensaio sobre a luz

Eu ainda causo-te o arrependimento

Os verões desnecessários

Passam por minha janela

Deixando o degrade da tua partida


Eu poderia lembrar-me das tuas noites

Por vidas sem fim


A tua imortalidade

Deixada pelas noites primaveris

Chegam a mim com tom cruel

Com tom de açoite

De surra

De tortura


A tua mão repousada sobre teus livros

Me trazem a lembrança do teu tato

Assim como trazem os rios a meus olhos


Eu lembro tanto, meu bem

Do movimento dos teus olhos

Da esquerda para a direita

Lendo minhas poesias

Assim como tua boca

Que com o passar dos versos

Iniciava o sublime movimento do teu sorriso


Se tem algo que me conforta

É a lembrança do teu corpo

De frente pra mim

Em posição de abraço

Me dedicando o teu aroma

O teu toque


Se tem algo que me fere

É a lembrança das tuas costas

Me deixando

Me deixando um espaço vazio

Onde os meus versos não podem te alcançar

E a minha dor não pode lembrar-te


Mas lembra, meu bem

Lembra e nunca esquece

Dos dias juntos

Em que o seu numero representa o infinito

E os nossos corpos tenderam a cola

Ao grude de amor e carne

Que sempre nos compôs


És paciência e teimosia

O café em insônia

Minha droga pessoal

Minha doce dependência sem precedentes

Intervalando minhas dores

Ritmando meus versos

E se compondo em luz

A tua única e fiel natureza.

Paulinho 22/02/2011

terça-feira, 15 de fevereiro de 2011

A noite e o "sim"

És meu sol em catarse

A luz que cega e chora

O que suporta o meu intimo

Aquilo que faz as dores da vida

Se tornarem a morte da solidão


Retrucas todo o meu amor

Dás reciprocidade aos meus olhos

Baixos, saudosos e fraternos

Te buscando em frias comunicações

Te trazendo de volta

Vestida de lembrança

Te perpetuando em mim

Trajada de futuro

Em expectativas reais


Ah, meu bem

Não desperdices minhas letras

Que te dão morada em mim

Que te abrigam no meu toque

Que via de regra

É frio e seco


Nas minhas mãos

E em meu peito

Quase nada vive

Nunca viveu

Mas tu vivificas

E me dás necessidade

Do que nunca havia tido


Eu me desfaço no negro lençol

Na víbora silenciosa da nossa saudade

Do nosso veneno e saúde


Os corpos se tocaram em desejo

As mãos apertaram-se em confiança

Os hálitos embaraçaram-se no espaço entre as bocas

Os olhos entreabertos

Viam-se na penumbra do romance


Corpos encaixados em prazer

Em íntima troca

Umbigos e cinturas

Que se beijam


E a pressa e o tempo

Se desfizeram

Perderam sua necessidade

Sua razão de existir

O que restou fora um momento sem tempo

Uma noite sem fim necessário

Uma alvorada voluntária

Um sol, que bem me lembro,

Nasceu vermelho em paixão

Aguardando o teu divino acordar


É vivido lembrar

Do teu rosto em pura sonolência

Repousando em meu peito

Agora fadado ao egoísmo das musicas de amor


A tua noite em mim

Fora uma noite de versos inesquecíveis

Em grata companhia eterna

Uma noite que até agora

Não teve coragem de acabar em mim


Em uma maquina gigante

Voaste em direção a um destino

Teimoso destino

Que insiste em nos unir

Em um uníssono

Refrão de saudade


Nos une em um monossilábico significado

Na palavra que nos representa

No som que nos identifica

Naquele verso que é o fundamento do nosso existir

O “sim”.

sábado, 5 de fevereiro de 2011

Morada do vento

Alguma coisa estranha

É o paladar da noite

Que no momento se encerra

Com o cuspe da alvorada


Eu sinto o que não sentira

Em anos de solidão resignada e confortável


Meu corpo dolorido

De vida e esperança

De saudade e lembrança

Daquilo que dorme vibrante

E desperta todos os dias

Para mais vibrações de vontade


Eu vejo teu rosto

Em diversos cantos e lugares

Em corpos formosos

Mas sem vida alguma

Nas vitrines exuberantes

Mas sem a graça do teu sorriso


Eu vejo teus olhos

Grandes e guardiães

De todas as luas apaixonadas

Se aproximarem de mim

No escuro impotente e mortífero


Por várias vezes

Sinto teus dedos tocarem meu rosto

No curso do sono inquieto


O fato é que és a caça

A besta voraz e fugitiva

Das minhas vontades desconhecidas


És o que busco em perpétua felicidade

Resides na agonia da companhia

Na doçura da separação

Que aguarda o reencontro


Me furtas as metáforas

Cerceando minha capacidade poética

Me dando apenas o grunhido de verdade

O ronco real dos rostos que se tocam


Me deste instantaneidade de sentir perfeito

Sem a construção lógica e barata

Do sentir fugaz e leviano


Sim, meu bem

Meus segredos são todos teus

Pois minha boca não se fecha

Quando quer te dizer

Minha garganta não se limita

Nem minhas letras tem horizontes.

Em mim pra ti

Nada tem pudor


És a minha falta de vergonha

Os versos que terminam no papel

Mas não param na inspiração


És os versos que sufoquei no proibido

Na jaula da solidão que me é natural

Na ilegalidade do meu âmago


O teu trabalho é a estética

A forma que se dá ao que se habita

Mas tua morada em mim

É tão sem nexo

Tão sem forma

Tão gigante quando tem que ser

E tão pequena para ter tanta leveza


Fraturaste uma fraqueza

Que pensava ser meu sustento

Uma fome exacerbada

Que pensava ser meu alento


É isso

Desmembraste um corpo sólido

Que poderia ser minha saúde

E o transformaste em algo indefinível

Que acompanha o movimento das palavras trocadas


És um vento dinâmico

Que se abriga em qualquer lugar

E a qualquer tempo

Em qualquer lugar que eu esteja

E a qualquer tempo do meu relógio parado.

quinta-feira, 3 de fevereiro de 2011

Partida


Partiste sem dor

Com teus olhos deixando os meus

Sem pensar na ida

Ansiando pelo retorno


E a lua se pôs com a tua partida

Dando lugar a um sol de possibilidades

Desestabilizando toda angústia

Desconstruindo toda a lógica medíocre

Reformulando distância em saudade

Toda dor em vontade


És a morfina do mundo

Amenizando ou curando

Tudo que possa dar fim


Nada em ti ou em mim se finda

O nosso olhar silencioso

Grita e quebra os copos da solidão

Faz escuridão em companhia

Dando luz ao janeiro frio


Clarificas as palavras

Que parecem se complicar

E ter as mãos geladas

Ao tentar te explicar


És ser sem explicação

Que se vive em plenitude

Na constância do dinâmico

E na beleza do sensato


O final do teu tempo

Foi o início do próprio tempo em si

Foi o relógio que começou a correr

De forma tradicional

Sem hora pra parar

Sem contagem a fazer

Só mesmo dando ritmo a nós dois


As dúvidas padecem com a tua presença

Estremecem ao ouvir tua voz


Trazes a baixo a fortaleza

Do que se conhece por separação


A tua presença é vivida e vivificante

Como a primeira respiração consciente da manhã

Como o teu perfume

Ressuscitando o que se parecia perdido


Partiste me deixando a esperança pendurada no peito

Em um círculo formado

Como o que se formou

Sem início nem fim

Composto só por um percurso infindável de possibilidades

Onde o seu fim

Nada mais é do que o prelúdio do recomeço.