quinta-feira, 31 de janeiro de 2013

Manifesto do Palhaço


Ele se lacrou em versos rubros
Se violou em seus próprios versos de vergonha
Nas suas imaginações de sobrevivência
Nas suas más ações
No seu egoísmo altruísta

Evasão rápida e conclusa
Nada aqui muda
Nada aqui cala
Nada aqui se aquieta
Tudo aqui se acumula

És meu pai, meu deus e meu escravo

Derretendo mentes e corações
Ele conquistou as ruas, os olhos claros e escuros
Negros, jabuticabas, verdes, azuis, melados em suas rimas e ritmos
Ele é o rei das minhas letras,
De meus dedos
Que marcam brandamente as teclas da velha maquina datilográfica

Agora ele é um cofre
Moribundo e fétido
Que arde em suas emoções reclusas
Nas sombrias passagens das almas
Ele é menino mendicante
Com fome e só
Fugindo de todo Sol, do todo lar e de toda bondade

Vomitando em si mesmo o ódio que se reservava no coração lírico
Sim, ele é seu próprio alvo
Quer o olho do touro em sua ira

De tanto doar o doce lhe restou apenas o amargo do asfalto
E eu assisti e assisto tudo
Com ódio nos olhos, com amor no peito
Com tudo que me é
Ele é e eu também
Eu o sou e ele me é
Sou ele, ele sou eu.

Ele precisa me pintar a cara,
Me vestir de seu herói,
Me ninar a cada noite em que a fúria me domina
Me adoça com suas metáforas.

Limpo lágrimas, sangue e tinta.
Limpo letras, limpo sua língua com agua quente e olhos negros

As petecas da minha cara são as mesmas da dele

Sim eu vou higieniza-lo na sua própria obra.
E nesse momento de dor e torres altas
Eu lhe lançarei os laços da minha farda
Protegerei seu coração de poeta em meu rosto maligno de divindade.

Sim, o poeta se lacrou  seus porcos imundos
Seu mundo inútil
Sentireis a ira das minhas formas macabras
Sim, o Deus-Palhaço volta e toma o mundo de assalto.
Firam meu corpo mutilado por suas amarguras e mediocridades
Atirem em mim as balas egoístas das suas filhas, das suas amantes.
Passem por cima de mim com suas coisinhas miúdas guardadas no saco velho e furado da sua honra.

Traíste o teu maior aliado,
Aquele que mais te amou
Que mais te quis e que mais te fez apaixonar.
Agora eu sou o que lhes resta por enquanto.

Sim, não mais versos de boca suave
Agora apenas líricas de um coração espinhoso
De uma língua que berra ao invés de cantar

No meio-dia das vossas vidas lhes tirarei o sombreiro
E vou expor seu couro imundo ao Sol que vos  crucificará
Permitirei que mesmo a Lua vos queime com minhas expressões letais.

Não vos darei a compaixão
Foi com ela que apunhalaste o poeta que agora se esconde
Lavarei a alma do poeta com as suas lagrimas
Com suas lagrimas expostas pelo orgulho agora desnudo
Pelo vosso preconceito agora a mostra
Pelo vosso hálito de dor
Quando até vossas orelhas esquentarão no inicio do tormento

Vos darei apenas os olhos do juiz,
Só recebereis de mim barras e não mais chaves.

O poeta pintou a minha cara com seu amor
Agora eu limpo a dele com a dor em que fui forjado.

-Roquentin. (Sim, o palhaço)
31/01/2013

segunda-feira, 21 de janeiro de 2013

Farol


Teu corpo marcado e findado
No alvo das estrelas que nem sempre aparecem
Teus olhos cravados com as esmeraldas da coragem
E o pequeno corpo frágil de cordeiro, caça.

E os teus dedos e movimentos
Percorrendo o amago da nostalgia das horas
Fadadas a te louvarem a cada segundo da tua curta e imensa vida

És a frustração dos corpos celestes
Encobertos pela fumaça dos homens

E a tua mente se entorpece

Teus olhos diminuem o farol da tua atenção
E teu amor se entrega pra mim
Em estado absoluto de espirito

Afinal, cruzaste terras e naturezas
Em ambulantes pássaros, teus fieis
E os ventos te trouxeram pra mim
No cuspe do destino que não existe
No colo do imaginário
Nisso que os pequenos chamariam de sonho.

No teu templo que habito
Percorro minhas coragens e virtudes
Te entregando a felicidade das letras

Minhas poesias são agora tuas
Minha mente compõe em tua homenagem
Na homenagem do pequeno poeta
Diante da franqueza da tua beleza.

O espaço se contrai com as tuas passadas
O mundo reverencia a forma como tua pele se marca
Ou como marcas a pele tingindo a alma.

Perseveras em minhas letras
Como teu amor persevera em mim
Sem cessar a necessidade mutua
Que sente o alvo das nossas mãos
De procurarem umas as outras
Em uma dança de chegada e regresso.

Me abrigaste em teu infinito e celeste amor
Eu te eternizei no negro dos meus olhos
E nas letras e palavras que desenham minha alma, tua.

-Paulinho Tamer
09/01/2013

terça-feira, 1 de janeiro de 2013

Pequena Dançarina


Pela primeira vez eu senti a necessidade de um clima são.
Senti as pupilas desejarem nada mais do que o são papel,
Senti os ouvidos não ouvirem nada mais do que o são silêncio,
Percebi o corpo sentindo a necessidade de todo o espaço possível
Sem interferências de corpos no mesmo espaço.

No meio do turbilhão da noite,
Guardado eu em meu armário,
Cercado pelas paredes tortuosas do destino que esculpi.

Abstive-me da solidão e parti.

Os meus olhos chegaram despretensiosos
Em ambientes tão familiares, com belezas tão comuns.
O piso era o mesmo,
As paredes da mesma cor,
As caixas dos corações lacrados continuavam encadeadas no ordinário.

Nem o ar era surpreendentemente novo,
Nem mesmo as janelas estavam em ângulos diferentes.

Brotaste do extremamente ordinário, do comum, do nada novo.
Com os quadris repousados em tapete vermelho barato
E todas as outras coisas sem beleza.

De imediato meus olhos captaram a tua beleza.
A beleza que partia da luz de todas as tuas formas.
Beleza partida, e em partida,
Iluminando humildemente o que poderia ser ofuscado.
Tuas retinas e tuas coisas eternizando o que houvesse ao redor.
Dando de si e tomando dos outros.

A voz mansa que quase não respondia a estímulos
Caminhando lindamente como sobre corda bamba,
Tocando os cantos emadeirados,
Dirigindo sua beleza pra tudo que não importava.

Na tua pele alva eu vi os riscos do que ainda te restava de ti mesma.
Foi quando os olhos apertaram e entenderam porque a tua pálida beleza.

Tiveste tua beleza violentada
Pelos vis inimigos do que és: transcendente,
E teus olhos, faróis, se borraram no espelho,
No lago que afogaste narciso também te afogavas,
Com tantas dores, com tantos motivos.

Eu te quis pra mim de imediato.
Te quis ressaltar tua digna beleza,
Tirar a luz do teu sol do inverno das tuas lembranças
E trazer à primavera dos meus braços.
Nos meus braços.

E o teu sorriso se abriu.
A felicidade brotou dos teus rubros lábios,
A tua beleza hoje grita e ordena,
E a cada vez que teus dentes se mostram
O tempo emudece para ti
Em um solene gesto de reconhecimento da tua grandeza

Hoje teu sorriso não vem mais do amarelo da boca
Mas do verde dos teus olhos.

Vejo o banho que tomas em plena caminhada
A higiene da tua beleza que meus negros olhos que te observam.

As ideias com tanto ritmo quanto teu corpo de pequena dançarina
Hoje saem de ti aos berros
E a luz fosca que antes vinha da tua cabeça,
Hoje vem vibrante das tuas entranhas,
De tudo aquilo que mais és.

E o que és?

És o repositório do mundo,
O santuário onde tudo se redime
E onde a beleza se ajoelha.

Tens o gosto de carne santa,
Onde toda a minha poesia se alimenta,
Pois o teu toque cura tudo em que falte arte,
E para tudo o que queira correr.

Ah, benzinho,
Vês em mim beleza
Enquanto eu quero apenas te mostrar o espelho.

És a magnitude das inspirações,
De onde minha poesia não mais precisaria de outra fonte
Senão te ter em mim e pra mim.

És a ganância negada às flores de terem todo o belo,
Pois tua pele, teu corpo, teus olhos, lecionam ao imortal
E o imortal que tentas captar está do outro lado da lente.

-Paulinho Tamer
01/01/2013